Desenvolvendo Lideranças com a Ajuda da Filosofia e das Neurociências
- Káritas Ribas e Marcello Árias
- 11 de nov. de 2012
- 5 min de leitura
Artigo produzido para o Congresso Brasileiro de Treinamento e Desenvlvimento - CBTD
Nos últimos anos temos presenciado dois fenômenos paralelos e de grande repercussão social. Um deles é o grande impacto das pesquisas em neurobiologia, que gradativamente tem nos concedido uma visão ampliada dos mecanismos de ação de nosso cérebro. Por meio desses mecanismos temos compreendido um pouco melhor o complexo mecanismo subjacente à nossa essência humana. O outro fenômeno é o do renascimento do interesse pela Filosofia. Esta, tem invadido as livrarias com textos menos herméticos e mais palatáveis, além dos textos clássicos, que fazem uma leitura agradável dos maiores pensadores de todos os tempos, adequando suas ideias aos dilemas enfrentados por todos nós em nosso cotidiano, seja ele vivido na particularidade de nossos afetos ou no convívio com colegas no ambiente corporativo. Um dos temas mais abordados por essas duas áreas do conhecimento nos concede maior clareza da forma como nós, seres humanos temos deliberado nossa existência. Em Filosofia essas questões respondem pelos nomes de Ética e Filosofia Moral. Com o passar do tempo os termos ética e moral adquiriram algumas conotações dentro do senso comum que não esgotam o profundo alcance de seus conceitos. Fundamentalmente, quando falamos em ética, estamos falando sobre escolhas. Deliberações sobre a melhor maneira de se viver, sobre a vida que vale a pena investirmos energia, sobre escolhas. É, portanto, um tema de enorme complexidade e intimamente atrelado às questões com as quais o líder se deparará no exercício de seus desafios profissionais. O desígnio e a livre deliberação sobre o que será classificado como bom, e o que será visto como mal para que se possa usufruir de uma vida prazerosa e harmoniosa é uma escolha subjetiva, pessoal, solitária, mas que pode ter enormes reflexos no cotidiano daqueles que serão afetados por esta decisão. Eleito o bem a ser perseguido, urge a delimitação de regras para valorá-lo, e essas regras estabelecerão o que são os conceitos de certo e errado dentro do universo deliberativo eleito. Comumente, para tais regras concede-se o nome de moral. As questões éticas e morais não são necessariamente rígidas e fixas. Se parecem mais como movimentos em um tabuleiro de xadrez, onde, muitas vezes, devido às circunstâncias e ao contexto, os movimentos de escolha podem e devem mudar. Todavia, esta flexibilidade na escolha dos melhores lances éticos e morais é delicada, pois corre-se o risco de se cair em um relativismo superficial, o que pode macular a imagem de uma liderança autêntica. Não se pode construir uma política organizacional sólida sem um alicerce ético concreto. A neurobiologia também tem se aventurado na investigação do humano e de suas escolhas. Todavia, esta se ampara não na subjetividade filosófica, mas na concretude do corpo, do cérebro, das células e dos instintos naturais para tentar trazer mais luz a este complexo campo do saber. Nos últimos trinta anos, as ciências que estudam o cérebro evoluíram de forma significativa. Assuntos que outrora eram demasiadamente subjetivos para atrair a atenção da ciência passaram a fazer parte do vocabulário desta érea do saber. Muitas descobertas sobre a dinâmica do funcionamento deste órgão espetacular tem atraído a atenção de diversos profissionais, tais como os relacionados à área de Treinamento e Desenvolvimento, profissionais de Recursos Humanos, filósofos, pedagogos, psicólogos, educadores em geral, entre outros. A crescente compreensão dos mecanismos biológicos subjacentes ao nosso comportamento tem esclarecido aspectos de enorme relevância para os seres humanos, e concedido um conhecimento teórico com enormes possibilidades de aplicação prática no dia a dia. Para pessoas que ocupam cargos de liderança, entender a dinâmica deste órgão pode ser de grande valia, uma vez que as neurociências têm estudado temas de interesse dos líderes em geral, como a biologia da liderança, os aspectos cerebrais relacionados às tomadas de decisão, o gerenciamento do estresse, as deliberações éticas e morais, e a compreensão do papel das emoções nos relacionamentos sociais. Durante muitos anos, o tema emoções foi tido como tabu dentro do mundo corporativo. Frases como “O trabalho não é lugar para a manifestação das emoções”, tornaram-se paradigmas corporativos. Todavia, quer seja no âmbito da filosofia, quer seja no âmbito da ciência, esta norma é demasiadamente utópica para ser respeitada. As emoções são parte integrante do ser humano e, quando bem utilizadas, podem ser de grande utilidade. O grande filósofo Bento de Espinoza já atentava que o homem, muito mais do que sua racionalidade, é dependente de suas emoções, que ele denominava de afetos. Segundo Espinoza, um afeto pode aumentar a capacidade do ser humano pensar. Um afeto pode, por exemplo, diminuir a potência do corpo e da mente, gerando uma diminuição da potência de pensar. Atuamente, psicólogos e neurocientistas estão cada vez mais conscientes de que as emoções podem e devem ser melhor compreendidas, pois, na medida em que as compreendemos melhor, podemos identificá-las, nomeá-las, investigar suas origens e suas causas e, consequentemente, optar pela melhor decisão, uma vez que toda a emoção pede uma tomada de decisão. Essa tomada de decisão não deveria ser totalmente emocional. Ela deve partir da emoção, para, posteriormente, tornar-se ponderada, racional e equilibrada. Atualmente existem inúmeras técnicas que podem ajudar o líder a compreender melhor suas emoções e de sua equipe, e gerí-las de forma mais adequada colaborando assim para o sucesso de sua liderança rumo a uma maturidade sadia no cotidiano de suas relações interpessoais. Maturidade e valores humanos são dois outros temas estudados pela filosofia e pela neurobiologia. Temas de grande relevância para o líder, uma vez que a liderança autêntica, genuína, muitas vezes faz com que os liderados admirem esses dois aspectos naquele que os lidera. Todavia, tais temas são profundos e desafiadores. Versar sobre valores humanos pressupõe uma investigação densa dos aspectos relacionados ao sentido que concedemos à nossa própria vida e a nossa existência como indivíduos e em sociedade. Para que possamos compreender minimamente o alcance dos valores humanos, talvez seja prudente perguntar a nós mesmos se temos clareza de quais são os aspectos de nossa vida, que nos motivam e que nos movem. O que de fato concede sentido para nossas vidas? Conseguimos conceituar com clareza nossos valores? Somos capazes de hierarquizá-los? Temos clareza de todos eles no momento de tomadas de decisão sob pressão? É possível que a maturidade seja dependente dessas competências. Sendo assim, colocar luz sobre tais questões pode ajudar o líder a ter mais clareza sobre seus próprios valores e, desta forma, o auxilie a colaborar com seus liderados para que estes encontrem os seus próprios valores e atinjam uma maturidade saudável do ponto de vista intra e interpessoal, sempre imprescindível para que possamos transformar meros grupos em equipes sólidas e com um grande senso de alteridade. A expressão de todas essas competências na maioria das vezes se dá por meio da linguagem. Muitas das opiniões explicitadas no cotidiano necessitam de uma linha argumentativa sólida, e isso pode gerar tensões em momentos onde se decidem aspectos relevantes para uma organização. A filosofia propõe algumas técnicas que nos fazem perceber que nem sempre o que nós pensamos correlaciona-se bem com o que achamos que pensamos, e recentemente, a neurobiologia tem explicado como incorremos neste erro. Nossa vida mental, depende diretamente de nossa vida cerebral, e apresenta um aspecto de grande peculiaridade, pois quanto mais fazemos uso de uma dada competência, quer seja ela corporal, verbal ou emocional, mais esta competência se automatiza e nos permite realizá-la, muitas vezes, sem que tenhamos consciência do ato executado. Isso nos é de grande valia, pois nos permite, por exemplo, dirigir um automóvel, sem que estejamos 100% conscientes deste ato. Todavia, em algumas ocasiões, esta tendência ao automatismo pode nos ser prejudicial. Quando a linguagem utilizada no cotidiano assume características automáticas podemos correr o risco de não sermos eficazes em nossas conversas e em nossos diálogos. Algumas correntes filosóficas e pedagógicas, como a ontologia da linguagem e a comunicação não violenta têm desenvolvido importantes ferramentas conversacionais que podem ser úteis na construção de diálogos mais ricos e plenos. O objetivo desta apresentação é explicitar o diálogo entre neurobiologia e filosofia, assim como apresentar algumas ferramentas aos líderes, para que estes possam

desenvolver conversas ainda mais claras, plenas, respeitosas, produtivas e eficazes no exercício diário de suas lideranças.
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